Quem já assistiu ao filme
Imagine ou o ducumentário
Gimme Some Truth, sem dúvida nenhuma se lembra de Phil Spector, aquele estranho homem com um robusto óculos escuros, que fez o backing vocal na música "Oh Yoko!".
Certamente muitos já viram seu nome estampado na contra-capa de alguns dos álbuns de maior importância para a música. Phil está entre os maiores produtores do Rock'n'Roll. Produziu o último álbum de músicas inéditas dos Beatles, o
Let it Be, utilizando sobras de estúdio do
Get Back Sessions. Produziu também, entre outros, os álbuns
Imagine,
Plastic Ono Band e
Rock'n'Roll, de John Lennon, além do
All Things Must Pass de George Harrison. Antes mesmo de fazer sucesso com os Beatles, Lennon já o admirava, pois antes de produzir as citadas obras-primas, Phil já era um mito do pop. É considerado um mago dos estúdios de gravação, "famoso como um técnico muito habilidoso na eletrônica e na engenharia de som", como disse Yoko Ono. No início da década de 60, produziu sucessos com grupos vocais acompanhados por um bloco sonoro com vários instrumentos (de guitarras a violinos) e muito eco, que causavam um impacto no ouvinte, o chamado "Muro de Som" -
Wall of sound, o que causava fascínio em Lennon.
Os maiores sucessos de Spector são "Be My Baby", com o trio feminino
The Ronettes, e os discos da dupla
Righteous Brothers, como "You've Lost That Lovin' Feelin'" e "Unchained Melody" (aquela do filme "Ghost"). No meio dos anos 60, Spector se isolou em sua mansão em Los Angeles e começou a ter uma obsessão paranóica por armas e esquemas de segurança. Mesmo com a reputação de "inalcançável", não se afastou do meio. O primeiro trabalho de Phil Spector e John Lennon foi a música "Instant Karma", de 1970. Phil estava em Londres e foi chamado por Lennon para cuidar da gravação da música citada, que, no mesmo dia, acabara de ser composta. Gravaram a música. John gostou tanto, que entregou as fitas do projeto
Get Back para Phil. Paul McCartney, ao contrário de John, detestou o álbum.
A edição de 9 de novembro de 2000 da revista Rolling Stone traz uma entrevista com Phil Spector, que lembrava de John Lennon com muito carinho: "Éramos como irmãos. Você podia falar para John mudar algo. Você podia falar para ele refazer alguma coisa. Ele era completamente flexível. Afinal, eu estava ali para tornar a vida mais fácil, para que ele não precisasse se preocupar com a produção. Todos os Beatles sabem como se grava discos e John sabia como gravar discos. Ele apenas não queria se incomodar com isso". Dizia que pensava em John todos os dias, que é muito feliz por ter conhecido John Lennon e Yoko Ono. Foi um momento lindo de sua vida.
Seu verdadeiro nome é
Harvey Philiph Spector, e nasceu no dia 26 de dezembro do ano de 1940, em Bronx, New York. Ele aprendeu a tocar guitarra e piano quando estava no segundo grau. Seus dotes como músico são mostrados tocando piano na música "Love", do álbum
John Lennon/Plastic Ono Band, primeiro álbum de inéditas de Lennon. Nessa gravação, Phil Spector diz ter errado muito, pois ele ficou responsável pelo solo de piano na música. "Levei 20 takes. Cometi um milhão de erros. Eu tinha memorizado, eu sabia o solo perfeitamente. Mas assim que John e Yoko entraram, comecei a errar notas" - diz Spector. John Lennon disse: "Você não gosta de estar do outro lado dessa porra dessa vidraça, né? Agora você sabe como é ser um artista".
Segundo Phil, o que Lennon precisava era de um editor. "É isso que os Beatles faziam, editavam uns aos outros. Agora eles não tinham mais ninguém, então eu preenchi esse espaço. John não podia mais virar para Paul e dizer 'o que você acha disso aqui?'. Ele não tinha mais aquela família. Ele estava acostumado a perguntar, gostava de retorno. Trabalhamos bem desse jeito". Depois de terem gravado o álbum
Plastic Ono Band, decidiram gravar um álbum mais comercial.
Imagine levou 6 dias para ficar pronto e mais um dia gravando as cordas em Nova York. Todos diziam que com Spector envonvido, ia levar uns 6 anos pra ficar pronto. "Em Imagine, sabíamos que ia ser um álbum na linha dos Beatles. John tocou para mim o tema de Imagine (ele tinha uma frase de piano que era muito boa) e eu disse: 'Está boa'. Fomos trabalhando a partir disso", lembra Phil.
Ele também lembra passagens engraçadas na vida de Lennon: "Uma vez, em um aniversário de John, estávamos num restaurante. Um dos violinistas soube que John estava ali, então ele chamou os outros violinistas. Eles vieram à mesa de John e, como tributo, tocaram 'Yesterday'. John reagiu: 'Eu não compus essa merda. Eu odeio essa merda dessa música'. Ele ficou puto, sabe?".
Ao ser perguntado onde estava quando John foi assassinado, respondeu: "Eu estava em casa. Recebi um telefonema. Foi uma coisa que nunca devia ter acontecido. John não acreditava em qualquer tipo de proteção. Não sei se era por causa de Nova York ou apenas por não ser mais um beatle e não estar sob escrutínio, mas acho que em seus últimos anos ele ficou mais confiante, mais descuidado. Ele parava e conversava com pessoas e muitas delas eram como o maluco que o matou: 'você escreveu tal música para mim'. Quem quer conversar com essas pessoas? Mas isso mostra que, apesar de odiarem serem Beatles, eles também sentiam falta disso. Sentiam falta da adoração". Sobre os Beatles: "Causaram um grande impacto porque, dos dez primeiros lugares da parada, eles tinham oito. Não dava para ignorar isso. Fiquei bem impressionado com as composições deles. Mas (eu falava isso para John) eles ainda perdiam de Elvis, para mim. Elvis ainda era o Rei. Minha ideia era juntar Elvis e John, teria sido um encontro incrível. Então Elvis morreu. E, em 1980, John se foi. Nunca se materializou, obviamente, e nós nunca trabalhamos juntos de novo. Mas teríamos feito (se John estivesse vivo)".
Relação John e Yoko: "Eles realmente se amavam. Amavam a amizade do outro. Eram como crianças na escola. Fiquei muito amigo de John, mas sempre soube que sua melhor amiga era Yoko. Era isso. Se você dissesse a John 'você está trocando os Beatles por Yoko', ele responderia 'eu não ligo. Vale a pena'. Ele estava feliz. É absurdo o que ela aguentou todos esses anos. Ela teve tanto a ver com a separação dos Beatles quanto Elvis Presley. Ela foi alguém que pegaram para culpar".
Phil Spector e John Lennon, trocaram algumas "declarações de amor" na época da gravação do álbum Imagine. John, após gravar a voz de Jealous Guy, disse: "É muito bom trabalhar com você, Phil. Muito bom. Já trabalhei com muita gente, mas confesso que é muito bom. Do fundo do meu coração". Quando John Lennon gravava o álbum
Rock'n'Roll, as brigas entre os dois eram grandes. Phil, como sempre, era o "controlador" das gravações. Assim sendo, John queria de um jeito, Phil queria de outro, causando brigas que podem ser ouvidas no
Lennon Anthology. Aconteceu o mesmo no álbum
Let it Be. Paul McCartney mandou uma carta para Allen Klein, empresário do grupo, reclamando da intervenção de Phil Spector na música "The long and winding Road". Na carta, Paul dizia: "No futuro, não quero ninguém interferindo em minhas músicas sem autorização".
Na época da gravação do álbum de Lennon,
Rock'n'Roll, Phil levou as fitas das gravações para a casa, e passou seis meses com ela. Toda vez que o John ligava para casa dele, recebia mensagens da secretaria do Phil dizendo: "Sr. Phil não está, viajou, morreu". Phil certa vez, chamou John na casa dele, e o trancou por três dias, inclusive o ameaçando de morte e com chantagens emocionais como, por exemplo, ameaçar apagar as fitas do álbum em que John cantava covers de antigos sucessos do Rock.
John Lennon preferia Phil Spector a George Martin: "Bom... Muitos dos nossos discos, como o álbum duplo dos Beatles, o George Martin não produziu pra valer. Não sei se era a norma, mas não produziu. Não lembro. Sei o que ele fazia no começo. George Martin fazia tradução, se o Paul queria usar violinos e tal, o George traduzia aquilo. Como em 'Im my Life', tem um solo de piano elisabetano. Fazia esse tipo de coisa. Eu dizia: 'Toque como Bach. Pode colocar doze compassos ali?'. E ele nos ajudou um pouco a desenvolver uma linguagem para falar com os músicos. Porque eu sou muito tímido e, por uma infinidade de razões, não gostava muito de músicos. Não queira ir falar com vinte caras e tentar explicar o que deveriam fazer. Porque, de qualquer maneira, eram sempre tão desagradáveis! Então, fora os primeiros tempos, eu não tinha muito a ver com aquilo. Fazia sozinho. Não é que eu use Phil em vez do George. E eu também não usaria ninguém. Não se trata de nada pessoal contra o George Martin. Só que ele... faz mais o estilo de música do Paul do que a minha".
"Dá pra ouvir o Phil aqui e ali no meu disco. Não tem nada específico, mas dá pra ouvir. Porque acho o Phil um grande artista - apesar de, como todo grande artista, ser bastante neurótico. Mas a Yoko e eu fizemos muitas faixas juntos. Ela me incentivava da outra sala e tudo mais, e a gente ficava enrolando. Então veio o Phil e trouxe uma energia nova, porque a gente estava começando a ficar saturado. Nós já tínhamos feito algumas coisas, e a emoção de gravar tinha diminuído um pouco. O Phil não ficava encrencando com a porra do estéreo e toda aquela merda. É só: 'Ficou bom? Está pronto'. Não interessa se tem alguma coisa mais proeminente ou menos. Se parece bom para mim como leigo e ser humano, está pronto. Não importa que isso seja como aquilo outro ou que a qualidade seja não sei o quê. E eu gosto disso".
(Depoimentos retirados do livro
Lembranças de Lennon)
Em 1989, Phil Spector entrou para o
Rock and Roll Hall of Fame. Em 13 de abril de 2009 foi declarado culpado de homicídio, no caso da morte de uma atriz em sua mansão, ocorrida seis anos antes. Os promotores disseram que Spector alvejou e matou a atriz Lana Clarkson em sua mansão na madrugada de 3 de fevereiro de 2003, após tê-la conhecido horas antes na discoteca em que a mulher trabalhava. O ex-motorista de Spector revelou ao júri que na noite da morte de Lana encontrou seu patrão com uma pistola e a mão ensanguentada, antes de dizer: "Acho que matei alguém". Phil Spector foi sentenciado em maio de 2009 à prisão perpétua.
Em 2013 foi lançado o telefilme Phil Spector que trata do primeiro julgamento.